Lei 14.344/22 – Lei Henry Borel

A Lei Henry Borel instituiu mecanismos de prevenção e enfrentamento da violência doméstica e familiar cometida contra crianças e adolescentes com base na alteração de diversos dispositivos legais, como o Código Penal, a Lei de Execução Penal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, a Lei de Crimes Hediondos e o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência.

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Leia até o final...

Lei Henry Borel e a Constituição Federal

Ao instituir mecanismos de proteção e enfrentamento a violência doméstica e familiar cometida contra crianças e adolescentes, o legislador viabilizou a execução das previsões estabelecidas pelo artigo 226, §8º e 227, §4º da CF.

Vejamos:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.

§ 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 4º A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.

Lei Henry Borel e o Código Penal

O Código Penal foi extremamente impactado pela promulgação da nova legislação. A primeira mudança ocasionada pela referida lei aplica-se a contagem do prazo prescricional dos crimes contra a dignidade sexual ou que envolvam violência cometidos contra a criança e o adolescente, vejamos:

Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr:

 V - nos crimes contra a dignidade sexual ou que envolvam violência contra a criança e o adolescente, previstos neste Código ou em legislação especial, da data em que a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.

A redação do artigo 121 do CP foi acrescida pela nova legislação, tornando o homicídio contra menor de quatorze anos crime qualificado e estabelecendo também aumento de pena nos casos em que o crime for praticado contra vítima deficiente ou com doença que aumente sua vulnerabilidade, nos casos em que o autor possua título de autoridade sobre o menor e, por fim, contra vítimas maiores de sessenta anos com saúde física ou mental vulnerável. Seguem as alterações:

Art. 121. Matar alguém:

Pena - reclusão, de seis a vinte anos.

IX - contra menor de 14 (quatorze) anos:

Pena - reclusão, de doze a trinta anos.

§ 2º-B. A pena do homicídio contra menor de 14 (quatorze) anos é aumentada de:

I - 1/3 (um terço) até a metade se a vítima é pessoa com deficiência ou com doença que implique o aumento de sua vulnerabilidade; 

II - 2/3 (dois terços) se o autor é ascendente, padrasto ou madrasta, tio, irmão, cônjuge, companheiro, tutor, curador, preceptor ou empregador da vítima ou por qualquer outro título tiver autoridade sobre ela.

Além das referidas alterações, a Lei Henry Borel também acrescentou um inciso a Lei 8.072/90 (Lei de Crimes Hediondos), tornando o homicídio contra menor de quatorze anos crime hediondo, portanto, insuscetível de anistia, indulto, graça ou fiança.

Vejamos a inclusão:

Art. 1o São considerados hediondos os seguintes crimes, todos tipificados no Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, consumados ou tentados:

I - homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2º, incisos I, II, III, IV, V, VI, VII, VIII e IX);

Lei Henry Borel e a Lei de Execução Penal

A nova legislação também estabeleceu mudanças quanto a pena de limitação de fim de semana, tornando obrigatório o comparecimento do autor do crime a programas de recuperação e reeducação, vejamos:

Art. 152. Poderão ser ministrados ao condenado, durante o tempo de permanência, cursos e palestras, ou atribuídas atividades educativas.

Parágrafo único. Nos casos de violência doméstica e familiar contra a criança, o adolescente e a mulher e de tratamento cruel ou degradante, ou de uso de formas violentas de educação, correção ou disciplina contra a criança e o adolescente, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.

Lei Henry Borel e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)

Vejamos as diversas alterações e inclusões realizadas no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Primeiramente, o art. 18B, VI, estipulou o atendimento de saúde especializado para crianças e adolescentes vítimas de violência:

Art. 18-B. Os pais, os integrantes da família ampliada, os responsáveis, os agentes públicos executores de medidas socioeducativas ou qualquer pessoa encarregada de cuidar de crianças e de adolescentes, tratá-los, educá-los ou protegê-los que utilizarem castigo físico ou tratamento cruel ou degradante como formas de correção, disciplina, educação ou qualquer outro pretexto estarão sujeitos, sem prejuízo de outras sanções cabíveis, às seguintes medidas, que serão aplicadas de acordo com a gravidade do caso:

VI - garantia de tratamento de saúde especializado à vítima.

O art. 70A, por sua vez, foi acrescido em sete incisos, a fim de estipular medidas de combate e prevenção das formas de violência cometida contra a criança e o adolescente:

 Art. 70-A. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deverão atuar de forma articulada na elaboração de políticas públicas e na execução de ações destinadas a coibir o uso de castigo físico ou de tratamento cruel ou degradante e difundir formas não violentas de educação de crianças e de adolescentes, tendo como principais ações:

VII - a promoção de estudos e pesquisas, de estatísticas e de outras informações relevantes às consequências e à frequência das formas de violência contra a criança e o adolescente para a sistematização de dados nacionalmente unificados e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas;

VIII - o respeito aos valores da dignidade da pessoa humana, de forma a coibir a violência, o tratamento cruel ou degradante e as formas violentas de educação, correção ou disciplina;

IX - a promoção e a realização de campanhas educativas direcionadas ao público escolar e à sociedade em geral e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das crianças e dos adolescentes, incluídos os canais de denúncia existentes; 

X - a celebração de convênios, de protocolos, de ajustes, de termos e de outros instrumentos de promoção de parceria entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades não governamentais, com o objetivo de implementar programas de erradicação da violência, de tratamento cruel ou degradante e de formas violentas de educação, correção ou disciplina; 

XI - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros, dos profissionais nas escolas, dos Conselhos Tutelares e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas referidos no inciso II deste caput, para que identifiquem situações em que crianças e adolescentes vivenciam violência e agressões no âmbito familiar ou institucional; 

XII - a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana, bem como de programas de fortalecimento da parentalidade positiva, da educação sem castigos físicos e de ações de prevenção e enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente;

XIII - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, dos conteúdos relativos à prevenção, à identificação e à resposta à violência doméstica e familiar.

Além das alterações apresentadas, o art. 70B também foi incluído ao ECA e estabeleceu a obrigatoriedade da presença de profissionais qualificados nos quadros de funcionários das entidades públicas e privadas, que atuem na área da saúde e educação, para reconhecer possíveis vitimas de violência:

Art. 70-B. As entidades, públicas e privadas, que atuem nas áreas da saúde e da educação, além daquelas às quais se refere o art. 71 desta Lei, entre outras, devem contar, em seus quadros, com pessoas capacitadas a reconhecer e a comunicar ao Conselho Tutelar suspeitas ou casos de crimes praticados contra a criança e o adolescente.

Uma das mais significativas mudanças realizadas no ECA ocorreu na inclusão de novas atribuições ao conselho tutelar, especialmente pela possibilidade de representação para obtenção de medida cautelar, vejamos:

Art. 136. São atribuições do Conselho Tutelar:

XIII - adotar, na esfera de sua competência, ações articuladas e efetivas direcionadas à identificação da agressão, à agilidade no atendimento da criança e do adolescente vítima de violência doméstica e familiar e à responsabilização do agressor;

XIV - atender à criança e ao adolescente vítima ou testemunha de violência doméstica e familiar, ou submetido a tratamento cruel ou degradante ou a formas violentas de educação, correção ou disciplina, a seus familiares e a testemunhas, de forma a prover orientação e aconselhamento acerca de seus direitos e dos encaminhamentos necessários;

XV - representar à autoridade judicial ou policial para requerer o afastamento do agressor do lar, do domicílio ou do local de convivência com a vítima nos casos de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente;

XVI - representar à autoridade judicial para requerer a concessão de medida protetiva de urgência à criança ou ao adolescente vítima ou testemunha de violência doméstica e familiar, bem como a revisão daquelas já concedidas;

XVII - representar ao Ministério Público para requerer a propositura de ação cautelar de antecipação de produção de prova nas causas que envolvam violência contra a criança e o adolescente;

XVIII - tomar as providências cabíveis, na esfera de sua competência, ao receber comunicação da ocorrência de ação ou omissão, praticada em local público ou privado, que constitua violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente;

XIX - receber e encaminhar, quando for o caso, as informações reveladas por noticiantes ou denunciantes relativas à prática de violência, ao uso de tratamento cruel ou degradante ou de formas violentas de educação, correção ou disciplina contra a criança e o adolescente;

XX - representar à autoridade judicial ou ao Ministério Público para requerer a concessão de medidas cautelares direta ou indiretamente relacionada à eficácia da proteção de noticiante ou denunciante de informações de crimes que envolvam violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente.

A inclusão do inciso XIII ao art. 201 do referido estatuto também representou um grande avanço, visto que possibilitou a intervenção do Ministério Público nas causas cíveis e criminais decorrentes de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente:

Art. 201. Compete ao Ministério Público:

XIII - intervir, quando não for parte, nas causas cíveis e criminais decorrentes de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente.

Por fim, a última alteração realizada no ECA consiste na vedação da aplicação da Lei 9.099/95 e da aplicação de penas de prestação pecuniária, observemos o art. 226 do estatuto:

Art. 226. Aplicam-se aos crimes definidos nesta Lei as normas da Parte Geral do Código Penal e, quanto ao     processo, as pertinentes ao Código de Processo Penal

§ 1º Aos crimes cometidos contra a criança e o adolescente, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995. 

§ 2º Nos casos de violência doméstica e familiar contra a criança e o adolescente, é vedada a aplicação de penas de cesta básica ou de outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.

Lei Henry Borel e o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência

O art. 28 da nova legislação acrescentou o inciso V ao art. 4º, da Lei 13.431, incluindo a violência patrimonial ao Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência, vejamos:

Art. 4º Para os efeitos desta Lei, sem prejuízo da tipificação das condutas criminosas, são formas de violência:

V - violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluídos os destinados a satisfazer suas necessidades, desde que a medida não se enquadre como educacional.

Conclusão

Em suma, é importante observar o esforço aplicado pelo legislador para coibir e punir a violência praticada contra a criança e o adolescente em território brasileiro. Vale ressaltar que as alterações legislativas apresentadas são recentes e suas consequências deverão ser analisadas posteriormente.

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