Aula 4, Tópico 1
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Irretroatividade ou retroatividade das novas normas

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Irretroatividade ou retroatividade das novas normas

  • Relação de dependência entre as diversas instâncias

NOVIDADE: Potencializa-se a relativização de independência entre as instâncias.

Já vimos anteriormente que a ação de improbidade administrativa não é uma ação penal (art. o 37, §4º da CF/88), a despeito de o art. 1º, §4º, da Lei 8.429/92, determinar a aplicação dos princípios do direito administrativo sancionador.

Sendo assim, surge o problema da imposição de sanções por diversas instâncias punitivas, tais como uma sanção criminal, uma sanção civil ou uma sanção administrativa, em razão da prática do mesmo fato.

Sobre a relação de dependência entre as diversas instâncias, o art. 21, § 3º, Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021, passou a dispor que:

Art. 21. A aplicação das sanções previstas nesta lei independe:

§ 3º As sentenças civis e penais produzirão efeitos em relação à ação de improbidade quando concluírem pela inexistência da conduta ou pela negativa da autoria.       (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

Portanto, diante de uma sentença penal absolutória, que reconhece a negativa de autoria ou inexistência da conduta, ela irá interferir e gerar a improcedência da ação de improbidade. É importante notar que até mesmo uma sentença civil poderá produzir os mesmos efeitos.

Obs.:  o artigo 935 do Código Civil também disciplina a relação entre as instâncias penal e civil.

O art. 21, § 4º, da Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021, preconiza:

Art. 21. (...)

§ 4º A absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta Lei, havendo comunicação com TODOS os fundamentos de absolvição previstos no art. 386 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal).        (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

Prevê o mencionado artigo que qualquer dos fundamentos lado 386 do Código de Processo Penal vão servir para impedir o trâmite da ação de improbidade correspondente ao mesmo fato.

Enfim, diante desse novo cenário normativo, potencializa-se a relativização da clássica independência entre as instâncias. 

Em relação ao tema, vários dispositivos passaram a remediar a questão da condenação do investigado nas diversas instâncias.

NOVIDADE: Remedia-se a questão da condenação do investigado nas diversas instâncias (penal, civil, e administrativa):

Art. 12, § 6º, Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021:

§ 6º Se ocorrer lesão ao patrimônio público, a reparação do dano a que se refere esta Lei deverá deduzir o ressarcimento ocorrido nas instâncias criminal, civil e administrativa que tiver por objeto os mesmos fatos.       (Incluído  pela Lei nº 14.230, de 2021) 

Art. 12, § 7º, Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021:

§ 7º As sanções aplicadas a pessoas jurídicas com base nesta Lei e na Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013, deverão observar o princípio constitucional do non bis in idem.      (Incluído  pela Lei nº 14.230, de 2021) 

O art. 18-A, Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021:

Art. 18-A. A requerimento do réu, na fase de cumprimento da sentença, o juiz unificará eventuais sanções aplicadas com outras já impostas em outros processos, tendo em vista a eventual continuidade de ilícito ou a prática de diversas ilicitudes, observado o seguinte:        (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

I - no caso de continuidade de ilícito, o juiz promoverá a maior sanção aplicada, aumentada de 1/3 (um terço), ou a soma das penas, o que for mais benéfico ao réu;        (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

II - no caso de prática de novos atos ilícitos pelo mesmo sujeito, o juiz somará as sanções.         (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

Parágrafo único. As sanções de suspensão de direitos políticos e de proibição de contratar ou de receber incentivos fiscais ou creditícios do poder público observarão o limite máximo de 20 (vinte) anos.       (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

Destaca-se, assim, a preocupação do legislador com a lógica das sanções impostas em diversas instâncias; se, por um lado, tem-se uma quebra da clássica independência entre as instâncias, diante do alargamento dos fundamentos de vinculação; por ouro lado, quando houver a condenação em várias instâncias, haverá um regime de unificação de sanção; um regime de dedução de ressarcimento, se já foi feito em outra via; previsão expressa na lei do princípio da vedação do bin in idem.

  • IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA EXCLUSIVAMENTE POR ATOS DOLOSOS

De acordo com o regime anterior, havia a improbidade administrativa no art. 9º (enriquecimento ilícito ao agente), 10 (dano ao erário) e 11 (violação aos princípios da administração) da lei 8.429/92. Com base nesse regime anterior, o artigo 10 admitia tanto a modalidade dolosa quanto a modalidade culposa do ato de improbidade administrativa que causasse dano ao erário.

Todavia, o legislador, em 2021, alterou esse cenário.

NOVIDADE: Somente são considerados atos de improbidade administrativa as CONDUTAS DOLOSAS nos arts. 9º, 10 e 11 (art. 1º, § 1º, Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021) – ao contrário da anterior previsão de ato culposo prevista no então art. 10. Significa dizer que danos causados por imprudência, imperícia ou negligência não podem mais ser configurados como improbidade.

Outra inovação diz respeito ao dolo genérico e dolo específico, em relação aos quais a jurisprudência do STJ era no seguinte sentido:

“5. O entendimento do STJ é de que, para que se reconheça a tipificação da conduta como incursa nas prescrições da Lei de Improbidade Administrativa, é necessário demonstrar o elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11 e, ao menos, pela culpa, nas hipóteses do artigo 10. Portanto, o ato de improbidade administrativa previsto no art. 11 da Lei 8.429/1992 exige comprovação de dolo, o qual, contudo, não precisa ser específico, bastando o dolo genérico” (STJ - AgInt no REsp 1.826.450/PR, 2ª Turma, j. 08/02/2021).

NOVIDADE: Passa-se a exigir o dolo específico (vontade direcionada à realização de um ato específico), de modo que não se contenta com o dolo genérico (simples consciência da prática de ato contrário à lei), nos termos legais (art. 1º, § 2º, Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021).

Portanto, anteriormente bastava o dolo genérico para configurar o ato de improbidade administrativa, ou seja, a contrariedade do ato à lei (de forma dolosa). Com a reforma provida pela lei 14.230/21, a LIA passou a exigir o dolo específico.

O que é o dolo específico?

Em obediência à Lei de Improbidade, o “dolo específico” do servidor é: “a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente” (art. 1º, § 2º, Lei nº 8.429/1992).

No mesmo contexto de dolo específico, cita-se o artigo 11, inciso VI, da Lei nº 8.429/1992:

Art. 11. (...)

VI - deixar de prestar contas quando esteja obrigado a fazê-lo, desde que disponha das condições para isso, com vistas a ocultar irregularidades;        (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

Logo, não é mais suficiente, para a caracterização do ato de improbidade administrativa, a omissão da prestação de contas pelo agente público, torna-se necessário também a comprovação da finalidade específica: ocultar irregularidades.

Nessa seara, citamos também o parecer ao projeto 10.887/2018 (convertido na lei 14.230/2021) do relator deputado Carlos Zarattini:

“A extirpação da modalidade culposa da improbidade administrativa é extremamente necessária na medida em que ações negligentes, imprudentes ou imperitas, ainda que causem danos materiais ao Estado, não podem ser enquadradas como atos de improbidade, pois lhes falta o elemento de desonestidade. Nesse contexto, necessário ainda incorporar algumas definições no texto da Lei, como, por exemplo, o conteúdo do elemento subjetivo ‘dolo’, a fim de excluir a interpretação que o equipara à mera voluntariedade do agente” (Parecer ao Projeto de Lei nº 10.887/2018. Voto do Relator Deputado Carlos Zarattini, em 21/10/2020. Disponível: < https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1938171&filename=PRLP+1+%3D%3E+PL +2505/2021+%28Nº+Anterior:+pl+10887/2018%29 . Acesso em 16 novembro 2021)

Por fim, destacamos a seguinte novidade: A ilegalidade sem a presença de dolo que a qualifique não configura ato de improbidade (art. 17-C, § 1º, Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021).

Art. 17-C. (..)

§ 1º A ilegalidade sem a presença de dolo que a qualifique não configura ato de improbidade.       (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

Assim, o raciocínio é o seguinte: a mera legalidade ou desrespeito à lei não é ato de improbidade administrativo, é necessária a presença da desonestidade, a qual é traduzida na exigência de dolo específico.

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