Aula 9, Tópico 1
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Outras sanções. Inquérito cível

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  • LEGITIMIDADE ATIVA NA AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

Vamos tratar, nesta aula, da legitimidade para a promoção da ação de improbidade administrativa.

Legitimidade é o a “pertinência subjetiva da demanda”, ou seja, é o estudo daquele que tem a legitimidade para buscar a tutela de determinado direito.

Na ação de improbidade administrativa, que é uma ação coletiva, há a característica da “legitimidade extraordinária”, prevista no art. 18 do CPC, segundo a qual, alguém, em nome próprio, havendo previsão legal, possui legitimidade para propor uma ação, defendendo direito alheio – aqui é direito da coletividade.

Art. 18. Ninguém poderá pleitear direito alheio em nome próprio, salvo quando autorizado pelo ordenamento jurídico.

(...)

No âmbito da lei anterior, a legitimidade ativa era do Ministério Público e também da pessoa jurídica lesada (ente público lesado) pelo ato de improbidade administrativa. Logo, havia uma dupla legitimidade ativa concorrente (qualquer um dos legitimados poderia ingressar em juízo sem a presença, no polo ativo, do outro legitimado).

Todavia, à luz da legislação atual, a legitimidade ativa passa ser exclusiva do Ministério Público.

NOVIDADE: A legitimidade ativa para a ação de improbidade administrativa passa a ser exclusiva do Ministério Público (art. 17, caput, Lei nº 8.429/1992, com redação dada pela Lei nº 14.230/2021) - e não mais, também, da pessoa jurídica interessada.

Art. 17. A ação para a aplicação das sanções de que trata esta Lei será proposta pelo Ministério Público e seguirá o procedimento comum previsto na Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), salvo o disposto nesta Lei.         (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)   (Vide ADIN 7042)     (Vide ADIN 7043)

(...)

Destaca-se, ainda, o que dispõe o art. 3º da lei 14.230/21 (não foi incluído na LIA):

Art. 3º. No prazo de 1 ano a partir da data de publicação desta Lei, o Ministério Público competente manifestará interesse no prosseguimento das ações por improbidade administrativa em curso ajuizadas pela Fazenda Pública, inclusive em grau de recurso. 

§ 1º No prazo previsto no caput deste artigo suspende-se o processo, observado o disposto no art. 314 do CPC. 

§ 2º Não adotada a providência descrita no caput deste artigo, o processo será extinto sem resolução do mérito

Sobreleva notar, quanto à legitimidade na ação de improbidade administrativa, o parecer às emendas de plenário, na época do da discussão do projeto de lei 10.887/2018 (que originou a Lei 14230/2021):

“(..) o regime das sanções previstas na Lei de Improbidade encerram restrições a direitos fundamentais de cidadania, como a suspensão dos direitos políticos dos agentes considerados ímprobos. Por esta razão, na mesma linha adotada no sistema penal, é imprescindível que a atuação seja feita por meio de órgão legitimado e isento. Ademais, a suspensão de direitos políticos impacta diretamente as disputas eleitorais, razão pela qual a manutenção da exclusividade da titularidade ativa do Ministério Público de modo a impedir a intervenção de agentes políticos no manejo de ações de improbidade” (Parecer às Emendas de Plenário. Projeto de Lei nº 10.887/2018. Voto do Relator Deputado Carlos Zarattini, em 16/06/2021. Disponível: < https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=2029543&filename=PPR+1+C EURG+%3D%3E+PL+2505/2021+%28Nº+Anterior:+pl+10887/2018%29 >. Acesso em 16 novembro 2021).

NOVIDADE: Como consequência da exclusão da legitimidade ativa da pessoa jurídica interessada, foi revogada a possibilidade de migração entre os polos da demanda na ação de improbidade administrativa, denominada de intervenção móvel ou legitimidade bifronte (revogação do art. 17, § 3º, Lei nº 8.429/1992, que remetia ao vigente art. 6º, § 3º, Lei nº 4.717/1965).

Sobre a legitimação bifronte Daniel Amorim Assumpção Neves leciona:

(...) o art. 6º, § 3º da Lei 4.717/1965 prevê uma atípica legitimidade ativa superveniente a esses sujeitos que, iniciando a ação em seu polo passivo, podem optar por integrar posteriormente o polo ativo, em litisconsórcio com o cidadão que promoveu a demanda judicial. 

Segundo o dispositivo legal ora analisado, a pessoa jurídica de direito público ou privado poderá, abstendo-se de contestar o pedido, passar a atuar ao lado do autor, criando uma espécie sui generis de litisconsórcio ativo ulterior formado pelo autor originário e um dos réus originários. A excepcional mudança de polo do processo, também admitida na ação de improbidade administrativa, deve se afigurar útil ao interesse público, cabendo ao representante legal ou dirigente da pessoa jurídica a análise do preenchimento desse requisito no caso concreto. (NEVES, Daniel Amorim A. Ações Constitucionais, 2ª edição. Grupo GEN, 2013.)

Com a lei a 14.230/2021, ficou revogado o art. 17, §3º, da lei 8.429/92, que permitia a legitimação móvel na ação de improbidade administrativa. Há, agora, a previsão do art. 17, § 14, Lei nº 8.429/1992.

NOVIDADE: A pessoa jurídica interessada será intimada para, querendo, intervir no processo (art. 17, § 14, Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021).

Art. 17. (...)

§ 14. Sem prejuízo da citação dos réus, a pessoa jurídica interessada será intimada para, caso queira, intervir no processo.          (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)   (Vide ADIN 7042)    (Vide ADIN 7043)

Nesse ponto, indaga-se: a pessoa jurídica interessada intervém como assistente simples ou como assistente litisconsorcial?

Parece-nos que a pessoa jurídica interessa interviria que como assistente simples, na medida em que ela não pode ser autora originária da respectiva ação. É um tema que deverá ser melhor desenvolvido pelos processualistas.

NOVIDADE: Se para a fase de conhecimento a legitimidade ativa é exclusiva do Ministério Público, temos que para a fase de liquidação (do dano) e cumprimento de sentença, a legitimidade ativa é primária da Fazenda Pública e subsidiária do Ministério Público (art. 18, §§ 1º e 2º, Lei nº 8.429/1992, incluídos pela Lei nº 14.230/2021).

Art. 18. A sentença que julgar procedente a ação fundada nos arts. 9º e 10 desta Lei condenará ao ressarcimento dos danos e à perda ou à reversão dos bens e valores ilicitamente adquiridos, conforme o caso, em favor da pessoa jurídica prejudicada pelo ilícito.         (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

§ 1º Se houver necessidade de liquidação do dano, a pessoa jurídica prejudicada procederá a essa determinação e ao ulterior procedimento para cumprimento da sentença referente ao ressarcimento do patrimônio público ou à perda ou à reversão dos bens.         (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

§ 2º Caso a pessoa jurídica prejudicada não adote as providências a que se refere o § 1º deste artigo no prazo de 6 (seis) meses, contado do trânsito em julgado da sentença de procedência da ação, caberá ao Ministério Público proceder à respectiva liquidação do dano e ao cumprimento da sentença referente ao ressarcimento do patrimônio público ou à perda ou à reversão dos bens, sem prejuízo de eventual responsabilização pela omissão verificada.         (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021) 

(...)

ATENÇÃO: para a fase de conhecimento da ação de improbidade administrativa, a legitimidade ativa é exclusiva do MP, mas para a fase de liquidação e cumprimento de sentença, a legitimidade ativa é primária da Fazenda Pública e subsidiária da MP.

Vamos prosseguir com o estudo do procedimento da ação de improbidade.

PROCEDIMENTO

  • Regra da congruência na ação de improbidade administrativa

Antes de 2021, vigorava a seguinte jurisprudência pacífica do STJ:

“5. Relativamente ao argumento de decisão extra petita ou ultra petita, sua inconsistência jurídica resulta do fato de que, ainda que não tenha sido expressamente requerida a aplicação de determinada sanção pelo promovente da ação de improbidade administrativa, não há nenhum impedimento para o julgador estabelecer uma reprimenda não reclamada de forma ostensiva. 6. Esta Corte Superior possui entendimento de que não há se falar em violação do princípio da congruência externa, porquanto se deve contemplar aquilo que se denominou jurisprudencialmente de interpretação lógico-sistemática da exordial. Assim, as sanções por ato ímprobo passam a ser entendidas como pedidos implícitos” (STJ - AgInt nos EDcl no AREsp 1.526.840/RJ, 2ª Turma, j. 13/10/2020).

Logo, admitia-se a condenação por sansão de ato de improbidade administrativa não descrito na petição inicial.

Esse cenário é alterado pelo artigo 17, §10-F, da lei 8.429/1992.

NOVIDADE: Inaplicação da exceção ao princípio da congruência em sede de improbidade administrativa, de modo que o juiz não poderá julgar impor sanção não requerida expressamente (art. 17, § 10-F, I, Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021).

Art. 17. (...)

§ 10-F. Será nula a decisão de mérito total ou parcial da ação de improbidade administrativa que:        (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

  • Fim do juízo de admissibilidade específico da ação de improbidade administrativa

Com a lei 14.230/21, pôs-se fim ao juízo de admissibilidade específico da ação de improbidade. Vejamos como era a jurisprudência pretérita desse tópico:

“8. (..) se há verossimilhança nas alegações do órgão autor e presença de indícios de atos ímprobos, com a devida narração da conduta imputada ao réu, a inicial da ação de improbidade não pode ser considerada inepta, devendo ser recebida. 9. Além disso, em recebimento da petição inicial da ação de improbidade administrativa, prevalece o princípio in dubio pro societate” (STJ - AgInt no AgInt no REsp 1.732.729/MS, 2ª Turma, j. 24/02/2021)

NOVIDADE: Não mais se tem a notificação do requerido para apresentar “defesa prévia/preliminar”, de modo que só depois o julgador decidia pelo recebimento da ação de improbidade administrativa (devendo fazê-lo bastando índicios da improbidade), quando o réu seria citado para contestar. No sistema atual, recebida a petição inicial, o réu já será citado para contestar no prazo de 30 dias (art. 17, § 7º, Lei nº 8.429/1992, com redação dada pela Lei nº 14.230/2021).

Ademais disso, a petição inicial deverá observar os requisitos elencados no art. 17, §6º, da LIA.

Art. 17. (...) 

§ 6º A petição inicial observará o seguinte:         (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

I - deverá individualizar a conduta do réu e apontar os elementos probatórios mínimos que demonstrem a ocorrência das hipóteses dos arts. 9º, 10 e 11 desta Lei e de sua autoria, salvo impossibilidade devidamente fundamentada;        (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

II - será instruída com documentos ou justificação que contenham indícios suficientes da veracidade dos fatos e do dolo imputado ou com razões fundamentadas da impossibilidade de apresentação de qualquer dessas provas, observada a legislação vigente, inclusive as disposições constantes dos arts. 77 e 80 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).       (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

(...)

§ 7º Se a petição inicial estiver em devida forma, o juiz mandará autuá-la e ordenará a citação dos requeridos para que a contestem no prazo comum de 30 (trinta) dias, iniciado o prazo na forma do art. 231 da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).         (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)

Atenção: se a petição inicial for rejeitada, será cabível recurso de APELAÇÃO (art. 17, §6º-B, da lei 8.429/92).

  • Inaplicação do efeito material da revelia na ação de improbidade administrativa

Atenção: revelia é a ausência jurídica de apresentação de defesa/contestação pelo réu (art. 344, CPC); a ocorrência da revelia não se confunde com os efeitos da revelia. Não aplicar o efeito material da revelia é não presumir como verdadeiros os fatos alegados pelo autor.

Vejamos a jurisprudência pretérita do STJ, que, antes mesmo da lei 14.230/21, já encampava esse raciocínio, por se tratar de direito indisponível. In verbis:

“4. (..) em demandas como a sub examine, em que se discute a prática de ato de improbidade administrativa. (..) embora tenha um caráter eminentemente cível, é inegável o caráter sancionatório da demanda, tendo em vista as sanções aplicáveis - que implicam, inclusive, na suspensão transitória de direitos políticos -, e, ainda, a eventual irradição dos seus efeitos para outras esferas, tais como, na administrativa e no penal. Assim, não só por se tratar de direitos indisponíveis, mas - e ainda o que é mais relevante - tendo em vista a natureza dos interesses envolvidos, sobreleva ainda mais a importância de se garantir exercício do direito de defesa ao requerido a fim de que o sistema de justiça possa prolatar uma resposta à sociedade que efetivamente proteja os interesses públicos envolvidos. (..) 7. Assim, constatada que a sentença foi de procedência no ponto que declarou a existência de ato de improbidade administrativa na conduta do ora Requerente, sem que ao mesmo tenha sido oportunizada a possibilidade de produção dos elementos de prova que entendesse necessário, sobreleva então a nulidade do processo ante a caracterização do cerceamento de defesa” (STJ - REsp 1.330.058/PR, 2ª Turma, j. 20/06/2013).

NOVIDADE: Inaplicação do efeito material da revelia ao réu que não apresentar contestação (art. 17, § 19, I, Lei nº 8.429/1992, incluído pela Lei nº 14.230/2021).

Art. 17. (...) 

§ 19. Não se aplicam na ação de improbidade administrativa:         (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

I - a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor em caso de revelia;        (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)

(...)

Logo, se o réu não contestar, o juiz não pode aplicar os efeitos da revelia (art. 374, inciso IV, do CPC), de forma que, o Ministério Público deverá comprovar cabalmente a ocorrência do ato de improbidade. Assim, não se julga com base em presunção, no âmbito da lei de improbidade.

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