Taxa Selic e a Irretroatividade da EC 113/22

A Emenda Constitucional 113/21 estabeleceu o novo regime de pagamentos de precatórios, modificou as normas relativas ao Novo Regime Fiscal e autorizou o parcelamento de débitos previdenciários dos municípios, além de instituir outras providências.
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Taxa Selic
Segundo o Banco Central do Brasil, a respectiva taxa corresponde à taxa básica de juros da economia brasileira, sendo considerada o principal instrumento de política monetária utilizado para controlar a inflação.
A Emenda Constitucional transformou a Taxa Selic em um único índice responsável por produzir efeito de remuneração do capital, atualização monetária e de compensação da mora. Sua aplicação será válida para a fase de conhecimento ou de execução e independerá da natureza da relação jurídica envolvida.
É importante ressaltar que esta taxa abrange, em si, os juros moratórios e a correção monetária. Por isso, não pode ser acumulada com nenhum outro índice.
EC 113/21
A Emenda instituiu inúmeras mudanças relacionadas à Taxa Selic. Entretanto, a redação do art. 3º suscitou diversas dúvidas relacionadas à irretroatividade da norma.
Vejamos o artigo em questão:
Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
As previsões elencadas pelo artigo passaram a vigorar a partir da data de publicação da Emenda Constitucional e não puderam retroagir, com base no art. 5º, XXXVI, da CF/88:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada
O direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada deverão ser preservados, não sofrendo interferências de novas leis. Neste sentido, as previsões do art. 3º da EC 113/22 passaram a ser aplicadas as condenações judiciais da fazenda pública ocorridas a partir de 09 de dezembro de 2021, data de publicação da alteração constitucional. Vale ressaltar que as condenações impostas anteriormente a promulgação da emenda serão regidas de acordo com os Temas 810/STF e 905/STF.
Vejamos o exemplo fornecido por Cunha (2022):
Tome-se como exemplo uma dívida judicial do ente público, com data base em 1º de janeiro de 2018, sujeita mensalmente a IPCA-E. A cada mês vencido, a correção monetária incidia sobre o valor da dívida. Essa incidência do IPCA-E se aperfeiçoa mês a mês. A nova regra, ainda que de estatura constitucional, não pode retroagir para desfazer a incidência mensal da correção monetária, que ocorreu de acordo com a regra então vigente, sob pena de retroação vedada pela Constituição. Ainda nesse mesmo exemplo, a nova regra não existia durante os anos de 2018, 2019, 2020 e quase a totalidade de 2021. Logo, não pode ser aplicada nesse período, pois não pode retroagir. Somente a partir de 9 de dezembro de 2021, com a vigência da Emenda Constitucional 113, é que passa a incidir a Selic, em substituição ao IPCA-E.
Ademais, com base na jurisprudência, a Taxa Selic poderá ser aplicada aos processos em curso, visto que a norma definidora dos juros monetários e da correção monetária possui natureza processual:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. CONSECTÁRIOS LEGAIS. OFENSA À COISA JULGADA. NÃO OCORRÊNCIA. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO.
1. Não há violação de coisa julgada. Os juros moratórios e a correção monetária são obrigações de trato sucessivo que se renovam mensalmente, razão pela qual devem ser calculados à luz da lei vigente. Por essa razão, o STJ firmou entendimento de que a lei superveniente que altera o regime desses juros e correção deve ser aplicada imediatamente a todos os processos. Nesse sentido: AgInt no REsp 1925739/RN, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16/08/2021, DJe 18/08/2021; AgInt no REsp 1494054/RS, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/06/2021, DJe 23/06/2021; AgInt no REsp 1904433/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/03/2021, DJe 19/03/2021.
2. Agravo interno não provido.
(AgInt no AREsp 1944981/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 14/02/2022, DJe 17/02/2022)
Em contrapartida, o art. 5º da EC 113/21 determina a aplicação do novo índice aos requisitórios já expedidos.
Vejamos:
Art. 5º As alterações relativas ao regime de pagamento dos precatórios aplicam-se a todos os requisitórios já expedidos, inclusive no orçamento fiscal e da seguridade social do exercício de 2022.
Em suma, pode-se observar que a irretroatividade do art. 3º não será suficiente para solucionar todas as questões de direito intertemporal que surgirão mediante a aplicação da nova lei.
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