Princípios constitucionais de direito penal: conheça mais

Veja conosco informações relevantes sobre os princípios constitucionais de direito penal e fique mais perto da sua aprovação em concursos públicos.

Já escrevemos de forma resumida aqui no blog do Master Juris sobre os principais princípios penais. A ideia do presente artigo, no entanto, é de analisar com maior profundidade os princípios constitucionais de direito penal.

Relevante apontar que não serão vistos todos os princípios, mas aqueles que são vistos com mais frequência em provas de concursos.

Princípios constitucionais de direito penal

Antes de iniciarmos, vale a perguntas: o que são os princípios de direito penal? Como vimos com mais profundidade anteriormente, os princípios de direito penal são os valores fundamentais que inspiram a criação e a aplicação deste ramo jurídico. Tais valores devem ser considerados pelo legislador, ao criar leis, e pelos aplicadores do direito, no momento de interpretarem e utilizarem as normas jurídico-penais.

Na ordem constitucional vigente, de uma maneira geral, temos princípios implícitos e explícitos. Aqueles são encontrados quando interpretamos o ordenamento jurídico como um todo, como um conjunto de valores com uma finalidade. Estes podem ser encontrados de maneira expressa num dispositivo legal. Independente, princípios possuem força normativa, devendo, portanto, ser ponderados quando do uso das normas jurídicas.

Vejamos agora cada um deles:

1. Princípio da reserva legal

Já escrevemos com detalhes sobre o princípio constitucional da reserva legal. Por isso não vamos detalhar com profundidade o referido valor neste trabalho.

Segundo ele, a lei, e somente a lei, é a fonte formal imediata do direito penal, de modo que só ela pode criar crimes e determinar as respectivas penas.

Esta razão de ser tem um motivo: evitar os arbítrios do Estado. Era comum que imperadores absolutistas determinassem penas por crimes que não eram previstos, ou que houvesse a criação de tribunais de exceção (ad hoc). Para evitar tais abusos, o tipo penal e sua respectiva penalidade devem ser descritos na norma.

2. Princípio da anterioridade

O princípio da anterioridade vem expresso no inciso XXXIX do artigo 5° da Constituição Federal:

Art. 5°. [...] XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

A lei penal deve existir para que certo fato possa ser punido. Logo, se uma conduta reprovável é praticada nesse instante, em não havendo legislação que a proíba expressamente, não poderá ser aplicada nenhuma punição na esfera penal.

Nessa esteira, importante ressaltar que não basta haver lei publicada. A lei tem que estar em vigor, ou seja, deve estar vencido o período da vacatio legis para que qualquer punição possa ser aplicada. A partir de então, pode haver julgamento do fato.

Como efeito imediato, a lei penal não irá retroagir, salvo para beneficiar o réu. Nesse sentido, temos expresso no inciso XL do artigo 5° da Constituição Federal:

Art. 5°. [...] XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;

Outro efeito decorrente deste princípio é que não poderá ser concedida extradição se a conduta imputada não era crime no Brasil na época em que praticada. Logo, ainda que ao tempo do pedido haja um tipo descrevendo o fato como criminoso, a extradição não poderá ser deferida se referente a ato anterior à lei.

Além disso, o Supremo Tribunal Federal possui decisão entendendo que, ainda que cumpridos os requisitos exigidos pelo princípio da anterioridade, a extradição não pode ser deferida se o país que a requer encara quadro de grave instabilidade política. Segundo a Corte, nesse caso, há risco do extraditando ser submetido a tribunal de exceção (ad hoc).

3. Princípio da alteridade

Segundo o dicionário Oxford Languages, alteridade significa "natureza ou condição do que é outro, do que é distinto". Entender essa palavra ajuda a entender bem este princípio.

Pelo princípio da alteridade, não se pode punir a conduta que prejudica somente quem a praticou. Logo, a autolesão não pode ser punida. Ou seja, para que um ato seja considerado criminoso e acarrete em punição, seus efeitos devem extrapolar a pessoa do agente.

Se um sujeito pega uma faca e corta a própria mão, portanto, não há crime. No entanto, se ele fura o braço de outra pessoa, fica configurado o crime de lesão corporal.

Há quem sustente que o artigo 28 da Lei de Drogas é uma exceção ao princípio da alteridade. Segundo eles, o dispositivo pune o denominado "crime do usuário", pois o usuário, em tese, está sofrendo reprimenda por ostentar essa condição, ou seja, mesmo sem ser traficante. Só que não é bem assim! Vejamos o que diz o dispositivo legal:

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas:

Ou seja, não é o uso que é punido, mas o porte. Não há que se falar em crime do usuário porque o bem jurídico protegido pela Lei de Drogas é a saúde pública, e o porte do entorpecente atenta contra ela.

4. Princípio da confiança

O princípio da confiança tem origem na Espanha e, segundo ele, todos aqueles que cumprem as regras estabelecidas numa sociedade esperam que os demais membros dela farão o mesmo.

Um exemplo prático esclarece com facilidade o que quer dizer o princípio da confiança: se uma pessoa para seu veículo no sinal de trânsito quando este está com a luz vermelha e avança quando a luz está verde, ela espera que todos os demais motoristas irão adotar o mesmo comportamento.

Imagine que você está na Inglaterra: lá, todos os motoristas dirigem nas faixas da pista da esquerda, e não nas faixas da pista direita, como aqui no Brasil. Isso porque os volantes dos automóveis, lá, ficam no lado direito do carro (ou seja, na posição do banco do motorista por aqui). Assim como no Brasil, todos daquele país esperam que os motoristas respeitem essa posição de direção. Assim, se você for para a Inglaterra, de modo a respeitar as regras de trânsito britânicas, terá que dirigir dessa forma.

O princípio da confiança tem especial relevância nos crimes de trânsito, em que os motoristas esperam que os demais condutores e os pedestres sigam e respeitem as mesmas regras.

5. Princípio da adequação social

O princípio da adequação social foi idealizado por Hans Welzel, tendo, portanto, estreita relação com o finalismo (ou "sistema da ação final"). Segundo ele, não pode ser imputada como criminosa a conduta que, embora tipificada como crime, não afronte o sentimento geral de justiça. É por isso que um tatuador pode exercer suas atividades sem que sofra reprimendas penais. Formalmente, a tatuagem é uma lesão corporal. Mas ela é aceita socialmente.

O mesmo acontece com a circuncisão, que é uma regra religiosa de alguns cleros: também se trata de lesão corporal, mas como a sociedade vê a conduta como normal, não há crime.

Logo, o princípio da adequação social tem duas finalidades:

  1. restrição ao direito penal, limitando a aplicação de penas a condutas socialmente aceitas;
  2. norte ao legislador, para que tutele adequadamente os bens jurídicos, escolhendo os que são realmente relevantes, e descriminalizando condutas socialmente adequadas.

6. Princípio da intervenção mínima

O princípio da intervenção mínima estabelece que a lei só deve prever as condutas e penas necessárias para a vida em sociedade. Ele surgiu na Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, na França.

Pelo princípio da intervenção mínima, o direito penal deve ser excepcional, atuando apenas quando outros ramos do direito não conseguirem, ou seja, apenas quando realmente necessário. Por isso que o sujeito que estaciona irregularmente não é punido penalmente, pois o direito administrativo, por meio de suas multas decorrentes do poder de polícia, são suficientes para punir o infrator. Nota-se, nesse ponto, que o legislador não tipificou tal prática na legislação criminal.

O princípio da intervenção mínima tem estreita relação com o princípio da reserva legal, de modo que um não vive sem o outro atualmente. Pelo princípio da reserva legal, basta que uma conduta seja prevista como criminosa para que haja punição penal do infrator. Então imagine que o legislador tipificou a conduta de assobiar em público. Todos aqueles que assobiarem serão julgados e criminalmente condenados.

Isso, no entanto, não faz sentido. A começar que nenhum outro ramo do direito pune a conduta de assobiar em público.

Por mais que a tipificação da conduta de assobiar em público não encontre óbice no princípio da reserva legal, ela não ofende nenhum bem jurídico e não é uma proibição necessária para que a vida em sociedade persista. Por tal razão, o princípio da intervenção mínima vai funcionar como uma causa de exclusão da tipicidade material para tais condutas que não maculam o convívio social e sejam penalmente previstas.

Logo, os destinatários da intervenção mínima são o legislador, para que edite leis que realmente ofendam a vida em sociedade, ou seja, que não são habilmente tuteladas pelos demais ramos do direito, e o juiz, para que só puna quando for realmente necessário; se houver a possibilidade de aplicação de uma indenização no lugar do encarceramento, aquela é preferível.

O princípio da intervenção mínima possui dois subprincípios:

I. Princípio da fragmentariedade do direito penal

O princípio da fragmentariedade se dirige ao legislador e determina que o direito penal deve ser a última etapa de proteção, ou seja, uma conduta só deve ser descrita como criminosa quando os demais ramos do direito não conseguirem tutelá-la com eficácia.

Um exemplo é o caso de fraudes em certames públicos: houve uma prévia tentativa de tutelar a conduta por meio de outros ramos, como por meio da expulsão do infrator do processo de seleção. Como não houve eficácia nas tentativas, houve tipificação do ato no artigo 311-A do Código Penal:

Fraudes em certames de interesse público
Art. 311-A.  Utilizar ou divulgar, indevidamente, com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de: 
I - concurso público;
II - avaliação ou exame públicos;
III - processo seletivo para ingresso no ensino superior; ou 
IV - exame ou processo seletivo previstos em lei: 
Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

Podemos falar, portanto, que, segundo o princípio da fragmentariedade, todos os ilícitos penais são ilícitos em outros ramos do direito, mas nem todos os ilícitos dos demais ramos são ilícitos penais. Ou seja, de todas as proteções estabelecidas pelo direito em geral, o direito penal tutela apenas alguns fragmentos.

Por outro lado, fala-se em fragmentariedade às avessas quando, ao invés de tipificar, é recomendável que o legislador descriminalize determinada conduta, pois outros ramos do direito conseguem protegê-la habilmente. Fala-se, desse modo, que houve a perda do caráter penal do ato. Foi o que aconteceu com a conduta de adultério, que era crime previsto no artigo 240 do Código Penal, foi revogado pelo legislador e atualmente é considerado ilícito civil, visto que tutelado por este ramo.

II. Princípio da subsidiariedade

O princípio da subsidiariedade se dirige ao juiz e deve ser utilizado nos casos concretos. Segundo ele, o julgador só pode aplicar o direito penal quando o problema não puder ser resolvido pelos demais ramos do direito.

Isso se justifica porque a punição penal é muito severa. Se houver uma mais branda e que gere resultados positivos, a favor da sociedade, esta é a penalidade a ser aplicada.

Um exemplo é o delito de estelionato: até 2019, mais da metade dos inquéritos que apuravam a conduta de estelionato eram arquivadas, pois o direito civil resolvia os conflitos que surgiam. Por tal razão, para diminuir o número de processos que chegavam às mãos dos juízes, em 2019 o legislador determinou que a ação penal em face do crime de estelionato somente se procede mediante representação prévia. Ou seja, acredita-se que ele só se procederá quando o direito civil não resolver o caso, o que facilita o trabalho dos julgadores.

7. Princípio da proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade possui duas funções no direito penal:

  1. Servir de proteção ao excesso, evitando que se puna mais do que o necessário para que o bem jurídico seja protegido; e
  2. Coibir ou impedir a proteção insuficiente ou deficiente de bens jurídicos, protegendo menos que o necessário.

Ou seja, quando o legislador cria crimes, ao cominar as respectivas penas, ele deve estabelecer patamares proporcionais de tempo mínimo e máximo. Por tal razão, o princípio da proporcionalidade é chamado de “princípio da razoabilidade” na Itália, tendo em vista que a pena estabelecida deve ser razoável em relação à conduta tipificada.

Os Tribunais Superiores já aplicaram o referido princípio algumas vezes. Por exemplo, quando da edição do §1°-B do artigo 273 do Código Penal, foi estabelecida pena de 10 a 15 anos:

Art. 273 - Falsificar, corromper, adulterar ou alterar produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais:
Pena - reclusão, de 10 (dez) a 15 (quinze) anos, e multa.
§ 1º - Nas mesmas penas incorre quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado.
§ 1º-B - Está sujeito às penas deste artigo quem pratica as ações previstas no § 1º em relação a produtos em qualquer das seguintes condições:
I - sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente;
II - em desacordo com a fórmula constante do registro previsto no inciso anterior;
III - sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização;
IV - com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade;
V - de procedência ignorada;
VI - adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente.

A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça entendeu que a penalidade prevista para esse crime é inconstitucional por ofensa ao princípio da proporcionalidade, pois protegeu de maneira excessiva o bem jurídico. Assim, estabeleceu que deve ser aplicada para o respectivo crime o parâmetro da penalidade previsto no artigo 33 da Lei de Drogas, podendo haver aplicação da causa de diminuição de pena estipulada no respectivo §4°:

Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa. [...]
§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organização criminosa.

Importante apontar que o Supremo Tribunal Federal, no entanto, tem julgados isolados em sentido contrário, entendendo pela constitucionalidade do patamar conferido ao crime em comento. Portanto, deve-se ter atenção ao que diz o enunciado das questões em provas. Se não pedir uma posição específica, recomenda-se que seja escolhida a resposta que retrata a posição do Superior Tribunal de Justiça, por ser decisão proferida pela Corte Especial. Caso peça o que diz aquele Tribunal, redobre o foco, pois ele possui apenas precedentes, sem caráter vinculante, afirmando haver constitucionalidade.

Por fim, o princípio da proporcionalidade serve de orientação para três bases diversas:

  1. Para o legislador, o princípio recomenda que haja proporcionalidade ao determinar a pena a determinada infração (proporcionalidade no plano abstrato);
  2. Para o judiciário, o princípio define que o juiz deve ser proporcional ao definir a pena-base e aplicar a punição;
  3. O princípio também se manifesta como uma orientação administrativa, no momento da execução da pena, de modo a avaliar o comportamento do preso e estabelecer a ele prêmios e punições.

8. Princípio da ofensividade

O princípio da ofensividade diz que só vai haver crime quando a conduta for capaz de causar dano ao bem jurídico protegido ou ao menos de colocá-lo em perigo de lesão. Por tal razão, ele também é chamado de princípio da lesividade.

Ele se dirige ao legislador, para que não crie crimes em face de condutas que não são penalmente relevantes e ao juiz, para que não aplique penalidades desnecessárias a certos casos. Não importa que a conduta é considerada reprovável do ponto de vista ético ou moral, segundo o princípio em comento, se ela não lesiona ou não coloca em risco qualquer bem jurídico, não deve haver punição em concreto ou em abstrato.

Nota-se claramente que o princípio da ofensividade tem estreita relação com os princípios da alteridade e da adequação social, já que não se deve punir o ato que prejudicou apenas quem o praticou e as condutas socialmente aceitas.

O princípio da ofensividade também impede que sejam punidas as condutas não iniciadas (artigo 31 do Código Penal):

Casos de impunibilidade
Art. 31 - O ajuste, a determinação ou instigação e o auxílio, salvo disposição expressa em contrário, não são puníveis, se o crime não chega, pelo menos, a ser tentado.

Aplicando o mesmo raciocínio, só se pode punir a tentativa quando iniciada a execução (art. 14, inciso II, do Código Penal):

Art. 14 - Diz-se o crime: [...]
Tentativa
II - tentado, quando, iniciada a execução, não se consuma por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Além disso, o princípio da ofensividade proíbe a punição de condutas internas, como pensamentos ou vontades, e condições pessoais, como ser torcedor de um time cuja torcida é considerada violenta.

9. Princípio da exclusiva proteção do bem jurídico

Esse princípio tem estreita relação com o funcionalismo moderado de Claus Roxin. Segundo o sistema apontado, a única função do direito penal, ou seja, sua missão exclusiva, é a de proteger bens jurídicos.

Assim, diz-se que não é função do direito penal servir como meio de vingança, pública ou privada, ou como fundamento moral ou filosófico, dentre outras possíveis razões que possam ser invocadas para sua aplicação.

Portanto, segundo o princípio, o direito penal existe exclusivamente para proteger bens jurídicos.

A definição do que é bem jurídico penalmente relevante é complexa, mas, basicamente, são os interesses relevantes para manutenção e desenvolvimento da sociedade. A seleção dos mesmos é feita pela Constituição Federal.

10. Princípio do "Ne Bis In Idem"

O referido princípio, que também é conhecido como "princípio da proibição do bis in idem", proíbe que uma mesma pessoa seja duplamente punida pelo mesmo fato. Por exemplo, o agente que comete latrocínio consumado não responderá por homicídio.

É com base nesse princípio que o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 241:

A reincidência penal não pode ser considerada como circunstância agravante e, simultaneamente, como circunstância judicial.

Para fins didáticos, veja um dos precedentes levantados para sua edição:

Penal e Processual Penal. Tráfico de entorpecentes. Condenação. Valoração da prova. Encadeamento de indícios sérios. Reincidência. Elevação da pena-base e consideração como agravante. Bis in idem. Recurso especial. Necessidade de reexame de provas. Vedação da Súmula n. 7-STJ.
1. É vedado o reexame do acervo probatório na via do recurso especial, por força do disposto na Súmula n. 7 deste Tribunal.
2. Por outro lado, é de se conceder, de ofício, ordem de “habeas corpus” a favor do recorrente, para, sem prejuízo da condenação, anular-se a sentença que, ao passo de ter considerado a reincidência para elevar a pena-base, ainda a empregou como agravante, em intolerável “bis in idem”.
3. Recurso não conhecido
(Recurso Especial 95.479-AM, Relator Ministro Anselmo Santiago, publicado no DJ em 06.10.1997)

11. Princípio da responsabilidade penal pelo fato

O princípio da responsabilidade penal pelo fato tem relação com o princípio da ofensividade e determina que o direito penal deve se preocupar com o fato praticado pelo agente, não com quem ele é, seu caráter, suas condições pessoais, dentre outros fatores de ordem estritamente pessoal.

Ele é um dos fundamentos contra a aplicação do direito penal do inimigo no ordenamento jurídico brasileiro, a punição antecipada daquele sujeito que é considerado perigoso à vida da comunidade.

12. Princípio da intranscendência da pena

Também chamado de princípio da intranscendência subjetiva, é ele que impede que a pena passe da pessoa do preso, ou seja, que seus familiares e outras pessoas respondam penalmente pela conduta do agente criminoso. Ele tem previsão no inciso XLV do artigo 5° da Constituição Federal:

Art. 5°. [...] XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;

Pela leitura do inciso acima, porém, depreendemos que o princípio não se aplica ao direito civil, encontrando apenas uma limitação em face do quantum pecuniário que será aplicado. Exemplificando, se houver condenação de ordem monetária na esfera penal e o agente criminoso vem a falecer, seus sucessores responderão pelo decretado até o limite do patrimônio a eles transferido.

13. Princípio da imputação pessoal

Também chamado de princípio da responsabilidade penal, ele impede que haja punição a quem agiu sem culpabilidade. Logo, só pode haver aplicação da pena àquelas pessoas que agem com dolo ou culpa. Do mesmo modo, não devem ser penalmente punidos os inimputáveis.

O artigo 19 do Código Penal é exemplo de aplicação do princípio:

Agravação pelo resultado
Art. 19- Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente.

O princípio da imputação pessoal, no entanto, é excepcionado em dois tipos penais:

  1. Segundo o inciso II do artigo 28 do Código Penal, a pessoa que voluntariamente ou culposamente se embriaga, apesar de não ter consciência do ato que pratica, responde penalmente;
  2. Se houver uma morte ou lesão corporal grave, os envolvidos em rixa respondem pelo resultado.

Art. 28 - Não excluem a imputabilidade penal: [...]
Embriaguez
II - a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.

 Rixa
Art. 137 - Participar de rixa, salvo para separar os contendores:
Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.
Parágrafo único - Se ocorre morte ou lesão corporal de natureza grave, aplica-se, pelo fato da participação na rixa, a pena de detenção, de seis meses a dois anos.

O princípio da responsabilidade penal se aplica à rixa por ser difícil (ou impossível, a depender do contexto) definir quem fez o que no momento da confusão. Em sendo assim, não se pode afirmar que o princípio em comento se aplica em todo e qualquer caso penalmente relevante.

14. Princípio da insignificância

Por ser informação que frequentemente é cobrada em prova, é importante de imediato apontar que o princípio da insignificância foi cunhado por Claus Roxin, na década de 70. Ele advém do Direito Romano, mais especificamente do brocardo minimis non curat praetor, ou seja, "o pretor não se preocupa com o que é mínimo". Aplicado ao direito penal, o juiz não deve se preocupar com as condutas insignificantes, que não causem lesão relevante ao bem jurídico tutelado.

O princípio da insignificância, também chamado de "princípio da bagatela", é uma causa supralegal de exclusão da tipicidade, não prevista em lei. Isso é simples de ser visto. A tipicidade penal é formada pelo somatório da tipicidade penal com a tipicidade material:

TIPICIDADE PENAL = TIPICIDADE FORMAL + TIPICIDADE MATERIAL

A tipicidade formal é a adequação da conduta praticada ao fato proibido previsto na norma penal. Ou seja, se o fato praticado se encaixa no que prevê a lei como crime, tem-se a tipicidade formal e a prática de uma conduta criminosa.

A tipicidade material é a lesão ao bem jurídico, bem como o perigo de dano causado. Como se nota, há aqui estreita relação com o princípio da ofensividade.

Se a conduta praticada pelo agente criminoso se adéqua à norma, temos a tipicidade formal; no entanto, se ela não ofende nenhum bem jurídico, não há tipicidade material. Por conseguinte, não há tipicidade penal, de modo que o fato perpetrado não será punido.

O exemplo mais utilizado é o do furto de uma nota de R$ 2,00 de uma pessoa rica; a vítima não sofrerá perda significante em seu patrimônio nem sentirá lesão alguma. Desse modo, pela aplicação do princípio da insignificância, ainda que formalmente haja crime, materialmente não há, e a conduta não será punida.

É o inverso do que ocorre quando da falsificação de uma nota de R$ 2,00: se a falsificação tem potencial de ludibriar as pessoas, só sendo reconhecida como falsa por um profissional, há crime contra a fé pública, não podendo ser aplicado o referido princípio.

Infração bagatelar própria e infração bagatelar imprópria

Apesar do princípio da insignificância também ser chamado de princípio da bagatela, importante distinguir a bagatela própria da imprópria.

A infração bagatelar própria é aquele fato que nasce atípica em virtude da aplicação do princípio da insignificância. Ou seja, ambas estão intrinsecamente ligadas. Todavia, o princípio da insignificância não se aplica à infração bagatelar imprópria.

A infração bagatelar imprópria vem de uma situação penalmente relevante, mas que perde a relevância posteriormente. Imagine que um sujeito pratique um furto de valor relevante. No entanto, ele confessa a prática do crime e, antes sequer de ser investigado, devolve ao dono da coisa o bem que furtado. O juiz, concluindo que a pena não é necessária, deixará de aplicá-la em virtude da impropriedade do delito previamente cometido.

Finalizamos aqui o estudo dos princípios constitucionais de direito penal

Em breve traremos mais textos! Fique atento!

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