Empresa Estatal não pode falir

As empresas estatais sempre foram tratadas de uma forma peculiar, especialmente se comparadas com as empresas privadas.

Um bom argumento para este tratamento diferenciado é o fato da empresa estatal ser uma pessoa jurídica de direito privado, mas integrante da Administração Pública indireta.

Um verdadeiro híbrido. Por vezes, regras de direito público incidem sobre ela, por exemplo, na obrigação de realizar concurso público para contratação de pessoal. Em outras situações, são tuteladas pelas regras do direito privado, como no caso do regime de contratação de pessoal pela CLT.

Uma entidade deste tipo requer muito cuidado do interprete, especialmente agora que possuímos uma lei própria para elas, o Estatuto da Estatal, Lei nº 13.303/2016.

No entanto, apesar do Estatuto da Estatal ter tratado em seu Título I a forma empresarial das estatais, nada versou sobre sua possibilidade de falência.

Originalmente, tínhamos o art 242 da Lei de SA, que impedia as sociedades de economia mista de falirem. A jurisprudência estendeu esta proibição para as demais estatais sob o argumento sensato que se uma estatal da qual o Estado possui a maioria das ações não pode falir, as demais, das quais o Estado tenha a totalidade das ações, também não poderiam falir.

E assim se cristalizou a impossibilidade das empresas estatais entrarem em falência.

No ano de 2001 tivemos uma surpresa nas alterações sofridas pela Lei de SA, quando da publicação da Lei nº 10.303, que, além de modificar o texto da lei, efetivou uma revogação expressa: Exatamente o art 242 da Lei de SA foi extinto.

A doutrina começou a trabalhar a matéria sem as amarras de uma lei, prevalecendo o entendimento que uma estatal prestadora de atividade econômica pode falir (mesmo tratamento dado a iniciativa privada – art 173,§ 1º, II da CRFB) e a prestadora de serviço público não pode falir (não precisa do mesmo tratamento dado à iniciativa privada – fora do art 173 da CRFB).

Pouco tempo depois, nasce a nova Lei de Falência, Lei nº 11.101/2005, que para nossa surpresa proíbe novamente a falência da empresa estatal, no entanto, sem ser clara quanto à qual estatal está atingida por sua redação. Veja o texto legal:

“Art. 2º Esta Lei não se aplica à:

I . Empresa pública e sociedade de economia mista;"

Percebe-se que o legislador não teve o cuidado de especificar se a estatal em questão presta atividade econômica ou serviço público.

Aplicando a clássica regra de interpretação “se o legislador não faz distinção o intérprete não pode criá-la”, prevalece o entendimento que toda e qualquer estatal está novamente protegida da falência.

O professor Celso Antônio Bandeira de Mello tem o entendimento que este artigo não pode proteger a estatal prestadora de atividade econômica, já que a constituição exige que ela tenha o mesmo tratamento dado à iniciativa privada, podendo então falir tanto quanto a outra.

Não temos nenhum caso pós CRFB/88 de falência de empresa estatal para trazer a jurisprudência e exemplificar o tema. Fica então a posição majoritária de que empresas estatais, sejam elas prestadoras de atividade econômica ou prestadoras de serviço público, não podem ser atingidas pela falência.

Leitura complementar: Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso de Direito Administrativo, 32ª edição, pág 10, item 63.

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Respostas

  1. Sempre tive dúvidas a respeito desse assunto. Mas, também pudera, né. Que confusão! Rsrs.
    Mais uma vez, muchas gratias, querido professor!