Covid-19: guarda compartilhada, unilateral e o direito de visita
Por conta do atual cenário de pandemia, estamos vivenciando uma circunstância excepcional de quarentena, a fim de minimizar a disseminação do contágio pelo COVID-19.
É de conhecimento geral que o estado de alerta causado pela pandemia vem afetando consideravelmente a sociedade global, requerendo de nós adaptações sociais nos mais diversos sentidos.
Mediante a esse contexto de restrições, é natural o surgimento de questionamentos quanto a viabilidade da constância do compartilhamento da convivência, conforme prevê acordo ou sentença de guarda compartilhada.
Poderia o menor permanecer transitando entre a residência de seus genitores em tempos de quarentena?
Afinal, o revezamento entre a residência dos genitores, seja pela guarda compartilhada ou pelo direito de visitação a ser exercido, pode ser o acesso de transmissão entre uma residência e outra.
Espécies de Guarda
O ordenamento jurídico brasileiro dispõe de duas espécies de guarda: unilateral e compartilhada, conforme estabelece o artigo. 1.583 do Código Civil:
Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada. (Redação dada pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 1 o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5 o ) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 2 o Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos. (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
I - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
II - (revogado); (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
III - (revogado). (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
§ 3º Na guarda compartilhada, a cidade considerada base de moradia dos filhos será aquela que melhor atender aos interesses dos filhos. (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
§ 4 o (VETADO) . (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 5º A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos, e, para possibilitar tal supervisão, qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos. (Incluído pela Lei nº 13.058, de 2014)
Guarda unilateral
A guarda unilateral, com previsão no parágrafo 1º do art. 1.583 do Código Civil, é aquela proporcionada a apenas um dos genitores.
Isto é, a mãe ou o pai terá a guarda do menor, sendo fixado um regime de visitação ao outro genitor.
A guarda será concedida àquele que tiver as condições mais favoráveis de exercê-la, isto é, aquele que possuir condições de prestar suporte moral, material e educacional ao menor, o que transcende consideravelmente apenas a questão financeira.
Assim fica claro que a guarda unilateral é o associação de direitos e deveres destinado a apenas um dos genitores, contudo, sem desobrigar o outro a supervisionar e prestar todo o auxílio ao menor.
Por esse motivo esta espécie de guarda é estabelecida apenas em condição excepcional, havendo comprovadamente sua necessidade.
Guarda compartilhada
Desde a promulgação da Lei 13.058 de 22 de dezembro de 2014 o regime de guarda compartilhada tornou-se regra, na intenção de que todas as decisões referentes a rotina do menor seja realizada conjuntamente pelos genitores, independente do menor viver a maior parte do tempo com apenas um destes, conforme dispõe o parágrafo 1º do artigo 1.583 do Código Civil:
§ 1º Compreende-se [...] por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.
Assim, a guarda compartilhada estabeleceu-se uma espécie de guarda onde os pais (mãe e pai) compartilham de forma igualitária as responsabilidades e a execução de direitos e deveres sob os filhos.
Sob o regime da guarda compartilhada, o menor possui domicílio fixo, e as visitas do outro genitor deverão ser definidas por um juiz ou acordada pelos próprios genitores.
Vejamos o que dispõe o parágrafo 2º do artigo 1.584 do Código Civil:
§ 2º Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, encontrando-se ambos os genitores aptos a exercer o poder familiar, será aplicada a guarda compartilhada, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.
Em teoria, a guarda compartilhada além de ser regra, é o regime ideal.
Assim, nas hipóteses em que não houver celebração de acordo entre os genitores, e ambos encontrando-se aptos a desempenhar o poder familiar, a guarda a ser aplicada será a guarda compartilhada, com exceção se um dos genitores declarar não possuir interesse na guarda do menor.
O direito de visita e a pandemia da Covid-19
O direito de visita é aquele na qual o genitor/genitora que não possui a guarda de fato do menor de idade tem de conviver com ele. Este direito possui previsão no artigo 1.589 do Código Civil, vejamos:
Art. 1.589. O pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.
O maior objetivo do direito de visita é estreitar os laços de afetividade existentes no seio familiar, bem como garantir ao menor seu pleno desenvolvimento nos mais diversos âmbitos.
Assim, fica claro que a visitação é um direito dos genitores, e nos casos onde não haja acordo, será fixado pelo juiz.
O artigo 19 do Estatuto da Criança e do Adolescente também dispõe sobre:
Art. 19. É direito da criança e do adolescente ser criado e educado no seio de sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente que garanta seu desenvolvimento integral.
O direito de convivência entre pais e filhos não é só um direito do genitor, mas sobretudo, um direito da criança, parte mais frágil da relação.
Como exercer esse direito em tempos de pandemia da Covid-19?
Não há amparo legal para a circunstância de calamidade que estamos vivenciando, devendo prevalecer mais do que nunca o bom senso das partes.
Tanto a guarda unilateral, a compartilhada e o direito de visita devem sobretudo, respeitar o melhor interesse do menor.
Esse cenário experimentado é inédito e requer adaptação, ainda que de forma temporária.
Por isso, é de suma importância que os genitores conversem entre si e alcancem um acordo. Tudo para resguardar a saúde e integridade do filho, em prol de um bem maior que é a vida.
O assunto é de tanta relevância que, recentemente, o desembargador da 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, José Rubens Queiroz Gomes, vetou um homem de visitar sua filha, pois este viajou à Colômbia.
A genitora da menor alegou que temia que sua filha fosse infectada pelo coronavírus, uma vez que possui problemas respiratórios graves.
O desembargador considerou que, levando em consideração o quadro da menor, “não haverá grande prejuízo se a criança permanecer mais nove dias sem ver o genitor”, uma vez que os pais são separados.
Além do mais, existem muitas decisões judiciais modificando ou até mesmo suspendendo a convivência de menores de genitores separados.
Sem dúvidas, é o impacto mais considerável e a curto prazo da pandemia no Direito de Família.
Qual a solução?
Ter bom senso!
A ausência da definição de regras não impede que os genitores/pais usem do bom senso e implantem uma rotina que assegure o melhor interesse do menor em tempos como os de hoje, de pandemia.
Ante a severidade da pandemia, é importante que o modelo de convivência seja ajustado - ainda que temporariamente -, e se for o caso, até mesmo sem que tenham que recorrer à Justiça, valendo-se da celebração de acordos.
Por estarmos inseridos numa nova realidade, é imprescindível que busquemos consensualidade quanto a resolução de forma ágil e personalizada para cada condição familiar apresentada.
Senso de responsabilidade é o que se espera das famílias, especialmente nesse momento de incertezas, restrições e crise.
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Legislação:
BRASIL. Código Civil Brasileiro. Lei nº 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Brasília: Senado Federal, 1997.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990.
Referências:
IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família - http://www.ibdfam.org.br/artigos/1397/Guarda+compartilhada+em+tempos+de+pandemia+de+COVID-19
Excelente abordagem sobre guarda. Texto bem esclarecedor!
Que bom que gostou! Bons estudos!!!
Ótimo resumo pontuando as diferenças