Comentários à Teoria Geral do Delito – Escola Neoclássica

Trazemos neste texto a segunda parte dos comentários que serão feitos à Teoria Geral do Delito, tratando da Escola Neoclássica. Continue acompanhando o MJ para mais informações.

Olá, concurseiros e concurseiras! Como vão os estudos? Muita ralação? Sem dificuldades, a posse não será tão valorizada quando alcançada, não acham? Vamos continuar na luta, todos os dias. Como disse o Almirante Barroso na Batalha Naval do Riachuelo, "Sustentar o fogo que a Vitória é nossa"! Este deve ser o nosso lema absoluto. 😉

Logo abaixo realizaremos breves comentários à teoria geral do delito, tratando, neste texto, sobre a Escola Neoclássica da evolução do Direito Penal. Caso queira ler sobre a fase anterior, a Clássica, temos um texto prontinho para isso. Mas se você já dominou este assunto, avance conosco.

Inicialmente, ressalta-se o fato de que uma nova fase surge como uma quebra de paradigma com relação à fase anterior. Não se quer dizer que a fase anterior está sendo desmerecida ou algo do tipo. Pelo contrário, ela foi importante. O ponto é mostrar que o estudo evoluiu, que se tem, aparentemente, uma nova teoria de maior relevo, que merece a devida atenção para o momento.

No entanto, e é importante que se tenha atenção a esse fato, uma escola não anula 100% a outra. Como vimos, até hoje temos influências da Escola Clássica em nosso Direito Penal. Assim ocorreu (e ainda ocorre, já que se trata de tema em constante evolução) com os sistemas do Direito Penal.

A Teoria Neoclássica, diga-se, surgiu como uma crítica à Fase Clássica, sustentando que esta, ao formalizar demais, causou um engessamento do sistema criminal. Com o objetivo de quebrar esse rigorismo formal, foram agregados elementos normativos. Antes, o Sistema Clássico buscava observar o comportamento criminoso e descrevê-lo; em sentido oposto, a Teoria Neoclássica buscou compreender o comportamento, para que depois fosse valorado pelo intérprete.

Como será visto, essa acadêmica também não foi perfeita, e logo surgiram orientações buscando melhorias para o Direito Penal. Por ora, no entanto, vamos nos ater ao estudo deste Sistema, para entendê-lo e captar suas vantagens e críticas aplicáveis.

Breves comentários à Escola Clássica da Teoria Geral do Delito

Com essas breves ideias em mente, vamos avançar no estudo deste momento da evolução do Direito Penal. Porém, antes de adentramos no tópico principal do texto, vamos fazer uma breve revisão? Revisar é algo que devemos aprender a fazer com constância, pois nos ajuda a fixar melhor o que antes aprendemos. Portanto, acostume-se a revisar sempre que possível, pois é um dos melhores conselhos que qualquer pessoa pode receber.

Avançando, a Teoria Clássica, ou Sistema Causal-Naturalista de Liszt-Beling, com o objetivo de dar maior segurança ao indivíduo contra o aparato estatal, pregou o formalismo e a exclusão de juízos de valores por parte do intérprete. Também pudera: pouco antes de seu surgimento, em termos históricos, vigorou o sistema inquisitivo em diversas partes do mundo. Este, como é sabido, ficou conhecido como um dos momentos mais tenebrosos da história. E não só isso, mas as revoluções burguesas também tiveram certa influência na sensação de necessidade desta proteção excessiva.

O grande erro da Escola Clássica, no entanto, foi justamente o formalismo exacerbado, que acreditava-se ser sua maior vantagem. Ao tentar "dissecar" o crime, ela engessou sobremaneira a aplicação do Direito Penal no período. Além disso, o direito não trazia solução para certos delitos, como a culpa inconsciente, a tentativa e a omissão.

É de se imaginar que tais questões exigiam uma resposta e não podiam simplesmente passar em branco. Com isso em vista, e buscando a aplicação da chamada "metodologia kantiana", surgiu a Teoria neoclássica, a qual agregou conceitos de ordem valorativa ao Direito Penal.

Teoria Geral do Delito - Escola Neoclássica

Como tratado, a Escola Neoclássica surgiu principalmente como uma crítica à sua fase anterior. De modo a evitar o engessamento do Direito Penal, baseou-se nas lições de Kant, com a finalidade de agregar conceitos valorativos, o que não era aceito pela Escola Clássica. Por tal razão, o Sistema Neoclássico também é conhecido por Teoria Neokantista ou Teoria Teleológica do Delito.

Teve como grande expoente o professor Reinhart Frank. Este dizia só ser possível punir o sujeito ativo que comete o delito numa situação normal, ou seja, quando ele devia adotar um comportamento diverso. Nota-se, então, que, pelo raciocínio apresentado, o crime foi cometido por opção do agente.

Deve-se ressaltar, no entanto, que a Escola Neoclássica não abandonou o cientificismo. Ela buscou agregar carga axiológica aos institutos do Direito Penal para flexibilizar seus conceitos. O objetivo, assim, era de compreender o comportamento perpetrado pelo agente para que o intérprete pudesse valorá-lo. Para isso, utilizou-se de elementos históricos e sociológicos, buscando a compreensão do fenômeno do crime. Afinal, o direito num todo deve ser construído com base na cultura de determinada sociedade.

No Sistema Clássico, o intérprete observava a conduta perpetrada, descrevia-a e, depois, descobria qual era o seu conceito. Na Fase Neoclássica, justamente por ser o direito advindo do comportamento cultural, diz-se que o Direito Penal é fruto deste; logo, as normas não são descobertas pelo intérprete, pois possuem valoração prévia dada pela sociedade.

Portanto, o Sistema Neoclássico objetiva transpor a ideia de crime como o comportamento físico que concretiza um resultado naturalístico.

Exemplificando

Houve uma época na sociedade brasileira em que, para legítima defesa de sua honra, o homem que fosse traído por sua esposa poderia matá-la, ou seja, cometer o crime de homicídio, sem que sofresse qualquer punição. A tese era de que, como a honra do marido foi ferida, para que ele pudesse defendê-la de maneira legítima, o assassinato era justificado.

Esse pensamento era fruto de uma sociedade patriarcal, machista, que tinha o homem no centro da família. Logo, por razões de ordem valorativa, levando-se em conta aspectos sociológicos da época, bem como seu momento histórico, o argumento da legítima defesa era autorizado por meio da valoração que o intérprete fazia.

Outro exemplo, trazido por Nelson Hungria, é o do cometimento do crime de abandono de recém-nascido ou incapaz para ocultação da desonra. Atualmente não se aceita essa interpretação. Porém, no passado histórico de nossa sociedade, também em virtude do momento patriarcal e machista em que se vivia, o autor entendia que a mãe solteira que praticasse a conduta apresentada não estaria cometendo crime. Afinal, o abandono era para ocultar sua desonra sexual. Logo, em virtude da valoração que se devia fazer da norma, era ato justificado.

Colegas, voltando à atualidade, e apenas para constar, vamos atentar que nenhuma das condutas narradas é aceita em nossa sociedade. Nosso contexto histórico e sociológico-cultural atual não permite atitudes como as apresentadas. Ok? Violência física contra qualquer pessoa, bem como abandono de recém-nascido e incapaz, é crime.

Elementos do Crime

A estrutura do Sistema Neoclássico segue a mesma da Fase Clássica. A diferença ocorre na adição de elementos normativos ao delito. Logo, a ação não admite somente resultado naturalístico, pois é possível haver um acréscimo feito por normas, o que permite a caracterização de crimes por omissão, culpa e tentativa.

Observe que a caracterização de crimes por omissão, culpa ou tentativa é possível em virtude da valoração que a Escola Neoclássica permite que seja feita. Afinal, existem casos em que tais condutas (ou ausência de comportamento) são relevantes. O sujeito que atira para matar e erra a vítima por poucos centímetros comete uma ação de interesse para o Direito Penal.

Sendo assim, mesmo condutas que não produzem resultados serão punidas de acordo com o Sistema Neoclássico.

Vamos aos elementos:

1. Fato Típico

No Sistema Clássico, o fato era descrito na norma, de maneira abstrata, e a ele se atribuía um resultado naturalístico. Na Fase Neoclássica, à ação são acrescentados elementos normativos (como acima visto) e subjetivos (como os motivos determinantes para cometimento do crime).

Exemplificando, quando o sujeito ativo comete o crime de corrupção privilegiada (art. 317, §2°, CP), ele está cedendo a pedido ou influência de outrem. O ato de ceder é o motivo determinante para a prática do delito.

Corrupção passiva
Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. [...]
§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem:
Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

2. Ilicitude

Para o Sistema Clássico, a ilicitude era a concretização da conduta descrita, contraposta ao tipo penal, no mundo real, ou seja, a prática do comportamento proibido formalmente pela norma.

Formalmente, a Escola Neoclássica não trouxe mudanças a esse conceito de ilicitude. No entanto, a ela agregou uma carga material, através da danosidade social do comportamento praticado. A consequência é que certos comportamentos proibidos serão admitidos quando praticados.

Por exemplo, o sujeito que desenha tatuagem em outrem não poderá ser punido por lesão corporal caso o faça com consentimento expresso. A conduta não causa dano à sociedade, sendo admita em seu seio.

O mesmo raciocínio se aplica à hipótese de furto de uso. Esse não é ilícito penal, mas civil, pois a lesão causada não é grave o suficiente para chamar aquele ramo do direito. Em caso de dano, a responsabilidade civil é suficiente para resolver o conflito que possa surgir.

3. Culpabilidade

Assim como no Sistema Clássico, dolo e culpa continuam sendo elementos da culpabilidade. No entanto, a ela se acrescenta a inexigibilidade de conduta diversa, sendo esta causa de exclusão culpabilidade. Assim sendo, em não sendo possível exigir outra conduta por parte do agente, não há que se falar em culpabilidade.

Além disso, para a Escola Neoclássica, em não havendo real consciência da ilicitude, não restaria configurada a culpabilidade, por ausência de dolo. Por isso, sem vontade ou consciência da prática de um ato ilícito, afasta-se este elemento do delito.

Logo, para que existisse a culpabilidade, devia haver o chamado Dolus Malus. Este nada mais é que o conhecimento, por parte do agente, de que a prática dolosa de determinada conduta, com a real consciência acerca de sua ilicitude, configura ato típico.

A culpabilidade, portanto, para esta Fase, é vista como um juízo de reprovabilidade da prática do ato ilícito. Antes ela era apenas psicológica, e agora passa a ser psicológica-normativa.

Uma curiosidade sobre o tema é que o Código Penal Militar, ao descrever os crimes dolosos e culposos, se revela neoclassicista. Confira o artigo 33 do diploma:

Art. 33. Diz-se o crime:
Culpabilidade
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;
II - culposo, quando o agente, deixando de empregar a cautela, atenção, ou diligência ordinária, ou especial, a que estava obrigado em face das circunstâncias, não prevê o resultado que podia prever ou, prevendo-o, supõe levianamente que não se realizaria ou que poderia evitá-lo.
Excepcionalidade do crime culposo
Parágrafo único. Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.

Críticas

Como visto, a grande crítica feita ao Sistema Clássico foi o engessamento causado ao Direito Penal devido ao formalismo excessivo. Além disso, como essa Fase não trazia solução para a punição de certos delitos, como a culpa inconsciente, a tentativa e a omissão, surgiu a necessidade de sua substituição, ante as necessidades da sociedade da época.

O Sistema Neoclássico, contudo, foi criticado porque, ao tentar quebrar com esse formalismo excessivo, flexibilizou demais as regras. Nessa fase, o intérprete ganhou muita liberdade para valorar. Imagine os riscos que isso trazia ao período: um juiz podia inocentar um sujeito claramente culpado porque, segundo sua convicção formada, não restou comprovado que ele tinha conhecimento da ilicitude do fato. Para outro, apresentados os mesmos elementos, a situação seria diferente. Tudo dependeria da valoração de cada um.

Desse modo, o surgimento do Sistema Finalista veio para diminuir a expansão do subjetivismo ora implantado. Este tema, no entanto, fica para outro texto.

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